Empresa pode ser punida por não avisar que produto é perigoso?

Consumidores confiam que os produtos colocados no mercado são seguros para uso. Essa confiança, no entanto, depende do dever das empresas de informar riscos. Quando um produto apresenta risco à saúde ou à segurança do consumidor, o fornecedor tem a obrigação de agir com transparência. Especialmente se descobrir a nocividade do produto após já tê-lo colocado à venda. Nesse artigo responderemos se uma empresa pode ser punida por não avisar que um produto é perigoso.

O Código de Defesa do Consumidor, por meio do artigo 64, trata desse dever legal. O dispositivo determina que a empresa deve comunicar o problema às autoridades e aos consumidores. Além disso, exige a retirada imediata do produto do mercado, caso a autoridade competente determine isso. Quem descumpre essa obrigação comete crime, podendo ser preso e multado.

A seguir, analisamos o artigo 64 do CDC, as suas implicações penais e civis, e as demais normas aplicáveis. Também explicamos o que o consumidor pode fazer caso adquira um produto perigoso não informado ao consumidor.

O que diz o artigo 64 do Código de Defesa do Consumidor?

O artigo 64 do Código de Defesa do Consumidor faz parte do capítulo que trata dos crimes contra as relações de consumo. Trata-se de norma penal em sentido estrito, que define uma conduta criminosa específica. Veja o texto legal:

“Art. 64. Deixar de comunicar à autoridade competente e aos consumidores a nocividade ou periculosidade de produtos cujo conhecimento seja posterior à sua colocação no mercado:
Pena – Detenção de seis meses a dois anos e multa.
Parágrafo único. Incorrerá nas mesmas penas quem deixar de retirar do mercado, imediatamente quando determinado pela autoridade competente, os produtos nocivos ou perigosos, na forma deste artigo.”

A redação é clara. Se o fornecedor descobre, depois da venda, que o produto representa risco, ele deve agir imediatamente. O aviso precisa ser feito tanto ao Poder Público quanto ao consumidor. E se o órgão responsável determinar a retirada, isso deve ser cumprido de forma imediata. Caso contrário, a empresa responde criminalmente.

A responsabilidade do fornecedor

O CDC determina a responsabilidade objetiva do fornecedor. Isso significa que ele responde pelos danos causados, mesmo sem culpa direta. O artigo 12 do Código estabelece:

“Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.”

Dessa forma, mesmo que o fornecedor só descubra o risco depois, ele continua obrigado a reparar o dano. Se o problema for potencial, ele deve atuar preventivamente. É nesse contexto que o artigo 64 se insere: como norma penal que reforça o dever de agir de forma preventiva e responsável.

A obrigação de informar o consumidor

Informar o consumidor sobre riscos do produto é dever legal. O Código de Defesa do Consumidor reforça isso em diversos artigos. O artigo 6º, inciso III, reconhece como direito básico do consumidor:

“III – a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem.”

O artigo 31 reforça:

“Art. 31. A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentem à saúde e segurança dos consumidores.”

Logo, ocultar ou omitir riscos é violação direta ao CDC. Quando isso ocorre, a empresa responde nas esferas civil, administrativa e criminal.

O que caracteriza um produto perigoso?

Produto perigoso é aquele que oferece risco à saúde ou à integridade física do consumidor. Esse risco pode decorrer de falha no projeto, erro na fabricação ou mesmo má conservação. Produtos com ingredientes tóxicos, embalagens defeituosas, componentes inflamáveis ou elétricos mal dimensionados são exemplos.

Nem sempre o risco é evidente no momento da venda. Às vezes, testes posteriores revelam a periculosidade. Nessas situações, o fornecedor tem obrigação de comunicar o problema e adotar medidas corretivas. É aí que o artigo 64 do CDC se aplica.

A importância da comunicação à autoridade competente

A empresa deve comunicar imediatamente o problema à autoridade competente. Isso permite ao Poder Público fiscalizar a situação e determinar providências. Na prática, a autoridade pode ser a vigilância sanitária, o Procon ou uma agência reguladora. O fornecedor não pode agir por conta própria. Ele precisa seguir a orientação dos órgãos responsáveis.

A omissão dessa comunicação é crime. Não importa se o produto já foi vendido ou não. A simples manutenção da circulação do item perigoso, sem aviso, caracteriza infração penal.

A retirada do produto do mercado

Caso a autoridade determine a retirada do produto, a empresa deve cumprir a ordem. Essa medida é conhecida como recall. O CDC trata do assunto no artigo 10, parágrafos 1º e 2º:

“§ 1º O fornecedor de produtos e serviços que, posteriormente à sua introdução no mercado de consumo, tiver conhecimento da periculosidade que apresentem, deverá comunicar o fato imediatamente às autoridades competentes e aos consumidores, mediante anúncios publicitários.”

“§ 2º Sempre que tiver conhecimento de periculosidade de produtos ou serviços no mercado de consumo, a autoridade competente deverá informar o fato ao público em geral e, quando necessário, determinar as providências cabíveis para evitar danos aos consumidores.”

Portanto, o recall não é facultativo. Se o risco for comprovado, e a retirada for determinada, o descumprimento configura crime. Essa é a previsão do parágrafo único do artigo 64 do CDC.

Penalidades previstas no artigo 64

A pena prevista é de detenção de seis meses a dois anos, além de multa. Como se trata de crime de menor potencial ofensivo, a pena pode ser substituída por medidas alternativas. Mesmo assim, o fornecedor será processado criminalmente. A reincidência e os danos causados podem agravar a situação penal da empresa ou de seus responsáveis.

Além disso, o Ministério Público pode ajuizar ação civil pública, com pedido de indenização coletiva. O consumidor, individualmente, também pode pleitear reparação por danos morais e materiais.

O que o consumidor pode fazer

Se o consumidor adquirir um produto que ofereça risco à sua saúde ou segurança, ele deve agir rapidamente. Primeiramente, deve interromper o uso do produto e guardar a nota fiscal. Em seguida, deve comunicar o fabricante, o vendedor e o Procon. Se o produto estiver em recall, o consumidor tem direito à substituição, reparo ou devolução do valor pago.

Caso não haja recall, mas o risco seja evidente, o consumidor pode procurar a Justiça. Ele pode pedir a condenação do fornecedor e a reparação dos prejuízos sofridos. O Código de Defesa do Consumidor garante ao consumidor o direito de ser indenizado por danos causados por produtos defeituosos.

O papel do Ministério Público e dos órgãos de defesa do consumidor

O Ministério Público tem legitimidade para investigar e processar os responsáveis por violações ao CDC. Ele pode requisitar documentos, abrir inquérito civil e ajuizar ações penais e civis.

Os Procons, por sua vez, têm poder de fiscalização administrativa. Podem aplicar multas, interditar estabelecimentos e exigir recall. Também podem intermediar conflitos entre consumidores e fornecedores.

A atuação conjunta desses órgãos é essencial para garantir a segurança do consumidor e a legalidade do mercado.

Conclusão: produto perigoso não informado ao consumidor é crime

O fornecedor que descobre que seu produto é perigoso, após colocá-lo à venda, deve agir com urgência. Ele precisa comunicar o fato à autoridade competente e aos consumidores. Além disso, se a retirada do mercado for determinada, deve cumprir imediatamente essa ordem.

Caso descumpra essa obrigação, o fornecedor responde criminalmente. A pena é de detenção de seis meses a dois anos, além de multa. Essa é a regra prevista no artigo 64 do Código de Defesa do Consumidor. Portanto, produto perigoso não informado ao consumidor é mais do que um defeito: é um crime.

O consumidor que se sentir lesado pode buscar seus direitos com base no CDC. Já o fornecedor deve agir com responsabilidade, cumprir as normas legais e respeitar a saúde e a segurança dos seus clientes.

Thales de Menezes

Advogado em Goiânia (GO) especialista em Direito Imobiliário e Direito de Inventário.

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