No Direito Sucessório, a figura do herdeiro indigno é um tema de grande relevância. Muitas famílias enfrentam situações de conflito, violência ou manipulação que envolvem herdeiros e o falecido. Nestes casos, a legislação brasileira estabelece hipóteses em que o herdeiro pode ser excluído da herança por indignidade, conforme os artigos 1.814 a 1.816 do Código Civil. Nesse artigo vou explicar quando um herdeiro pode perder a herança por indignidade.
Neste artigo, vamos responder as principais dúvidas sobre o assunto com base na legislação e na jurisprudência. Abordaremos quais comportamentos podem gerar a exclusão por indignidade, se brigas e xingamentos são suficientes, como comprovar coação, se a acusação de homicídio basta e o que acontece com os descendentes do herdeiro excluído.
O que é a exclusão por indignidade?
A exclusão por indignidade é uma sanção jurídica que impede uma pessoa de receber herança ou legado devido a condutas graves contra o autor da herança. Trata-se de uma forma de proteção ao falecido e ao respeito à sua memória.
Conforme o artigo 1.814 do Código Civil, são considerados indignos de herdar:
I – aquele que houver sido autor, coautor ou partícipe de homicídio doloso, ou tentativa, contra o autor da herança, seu cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente
II – aquele que houver acusado caluniosamente o autor da herança de crime que o Código Penal pune com reclusão
III – aquele que, por violência ou meio fraudulento, impedir ou obstar que o autor da herança faça livremente seu testamento, o modifique ou o revogue
Em todos esses casos, é necessário o ajuizamento de ação judicial específica para o reconhecimento da indignidade. O simples fato de ter havido uma conduta reprovável não é suficiente por si só para excluir o herdeiro. É preciso sentença judicial que declare expressamente a exclusão.
Xingamentos ou brigas excluem o herdeiro da herança?
Discussões, desentendimentos ou mesmo xingamentos isolados entre o herdeiro e o falecido, por mais desagradáveis que sejam, não são suficientes para caracterizar indignidade.
Para que o herdeiro seja excluído, é necessário que tenha praticado um dos atos previstos no artigo 1.814 do Código Civil. Ou seja, é preciso haver:
- Uma tentativa ou prática de homicídio doloso
- Uma acusação caluniosa de crime grave
- A prática de coação, fraude ou violência para interferir no testamento
Brigas familiares comuns, por mais intensas que sejam, não configuram nenhuma dessas hipóteses legais. Assim, o herdeiro não perde o direito à herança por meros desentendimentos com o pai, a mãe ou outro familiar.
Acusação de homicídio basta para excluir o herdeiro?
Apenas ser acusado de homicídio não é suficiente para a exclusão por indignidade. A legislação exige mais do que uma simples denúncia ou processo criminal em andamento.
Para que o herdeiro seja excluído, é necessário que haja condenação penal definitiva, ou seja, com trânsito em julgado. Além disso, deve ser ajuizada uma ação cível específica para reconhecimento da indignidade, nos termos do artigo 1.815 do Código Civil.
Portanto, até que exista uma condenação penal definitiva, o herdeiro continua tendo direito à herança. Se a condenação ocorrer, caberá à parte interessada ajuizar a ação de exclusão no prazo legal, com base na sentença criminal.
Testamento feito sob ameaça pode excluir herdeiro?
Sim. Quando o testamento é feito sob coação, ameaça ou fraude, e essa conduta parte de um dos herdeiros, ele pode ser excluído da herança por indignidade.
O inciso III do artigo 1.814 do Código Civil trata exatamente dessa situação: se o herdeiro impedir ou obstar, com violência ou meio fraudulento, que o autor da herança faça, modifique ou revogue seu testamento, poderá ser declarado indigno.
Nesses casos, é essencial reunir provas robustas da coação, como testemunhas, mensagens escritas, áudios ou qualquer outro elemento que comprove a interferência indevida.
Além disso, a parte interessada deverá ajuizar ação judicial pedindo a anulação do testamento por vício de consentimento e, também, a exclusão do herdeiro por indignidade.
A venda de bens feita antes da exclusão é válida?
Sim. Mesmo que o herdeiro seja posteriormente excluído da herança por indignidade, os atos que praticou antes da exclusão continuam válidos perante terceiros de boa-fé.
É o que estabelece o artigo 1.815, §2º, do Código Civil: a sentença de exclusão tem efeito retroativo, mas não prejudica os direitos de terceiros que adquiriram bens do herdeiro de boa-fé.
Contudo, o herdeiro excluído poderá ser obrigado a indenizar os demais sucessores, em valor correspondente à parte da herança que indevidamente transferiu a terceiros.
Isso significa que os demais herdeiros não perdem o valor correspondente, mas terão que buscar judicialmente a reparação.
A exclusão afeta os filhos e netos do herdeiro indigno?
Não. A exclusão por indignidade é pessoal, ou seja, afeta apenas o herdeiro que cometeu o ato indigno. Os descendentes desse herdeiro não são penalizados.
De acordo com o artigo 1.816 do Código Civil, os descendentes do herdeiro excluído herdarão a parte que caberia a ele, como se este já tivesse falecido no momento da abertura da sucessão. Isso se chama representação sucessória.
Assim, os filhos e netos do herdeiro indigno não são prejudicados pela exclusão. Eles assumem o lugar do excluído na herança, garantindo a continuidade da linha sucessória.
Como provar coação na mudança de testamento?
A coação para que o falecido fizesse, modificasse ou revogasse seu testamento é uma das hipóteses de exclusão por indignidade. Mas para que essa exclusão seja reconhecida, é necessário provar o ato ilícito.
Essa prova pode ser feita por diversos meios:
- Testemunhos de pessoas que presenciaram ou ouviram o falecido comentar a coação
- Mensagens escritas, áudios, vídeos ou documentos que demonstrem a ameaça ou pressão
- Perícias em documentos ou até exames psicológicos, dependendo do caso
Toda essa prova deve ser levada a juízo, e o juiz avaliará se há elementos suficientes para declarar o herdeiro indigno. O processo corre na esfera cível e deve ser iniciado pela parte interessada, normalmente outro herdeiro ou o Ministério Público.
Existe prazo para pedir a exclusão por indignidade?
Sim. O artigo 1.815, §1º, do Código Civil estabelece que a ação para exclusão por indignidade deve ser proposta no prazo de 4 anos, contados da data da abertura da sucessão, ou seja, da data do falecimento do autor da herança.
Esse prazo é decadencial, ou seja, uma vez transcorrido, a pretensão de excluir o herdeiro se extingue, e a exclusão não poderá mais ser reconhecida judicialmente.
Por isso, é essencial que, ao se identificar uma possível causa de indignidade, os herdeiros ou interessados procurem orientação jurídica com urgência para garantir seus direitos.
Perdão do falecido impede a exclusão?
Sim. O artigo 1.818 do Código Civil prevê que o herdeiro não poderá ser excluído por indignidade se houver perdão expresso do autor da herança, feito em testamento.
Esse perdão deve estar registrado de forma clara e direta no testamento, demonstrando a vontade do falecido em perdoar o ato praticado pelo herdeiro.
Se o perdão for tácito ou não estiver documentado, ele não impede a exclusão por indignidade. A jurisprudência exige o perdão formal e expresso para afastar os efeitos da indignidade.
Portanto, mesmo que o herdeiro tenha cometido um dos atos previstos no artigo 1.814 do Código Civil, ele ainda poderá herdar se houver perdão formal no testamento.
Negligência com pai ou mãe idoso exclui da herança?
A simples negligência com pais idosos, como abandono afetivo ou falta de cuidados, não gera exclusão por indignidade segundo o Código Civil.
No entanto, essa conduta pode fundamentar a deserdação, desde que seja formalizada em testamento. A deserdação, prevista no artigo 1.961 do Código Civil, permite que o testador exclua herdeiros necessários quando houver causa grave prevista em lei, como:
- Injúria grave
- Relações ilícitas com o cônjuge do falecido
- Ofensa física
- Desamparo em enfermidade grave
Ou seja, o autor da herança pode manifestar, por testamento, sua vontade de deserdar o herdeiro que o negligenciou, desde que fundamente legalmente o ato e comprove o comportamento ofensivo.
A deserdação também exige processo judicial, onde se comprovará a causa alegada pelo testador.
Conclusão: Herdeiro pode perder a herança por indignidade?
A exclusão por indignidade é uma medida jurídica séria e restritiva, aplicada em casos de condutas gravíssimas contra o falecido ou contra a livre disposição da herança. O Código Civil brasileiro estabelece critérios rigorosos para essa exclusão, exigindo sempre uma sentença judicial.
É fundamental que herdeiros e familiares estejam atentos aos prazos, provas e procedimentos legais. Condutas como brigas familiares, negligência ou desentendimentos, por mais lamentáveis que sejam, não configuram, por si só, causa de exclusão por indignidade.
Já atos como homicídio, calúnia grave ou coação no testamento podem, sim, resultar na perda do direito à herança, mas sempre com a devida comprovação judicial.
Quando houver dúvidas sobre a conduta de um herdeiro ou sobre a validade de um testamento, o mais prudente é buscar orientação de um advogado especializado em Direito Sucessório.
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