Quanto da quantia paga eu recebo de volta no distrato de imóvel?

O distrato de imóvel é uma realidade comum no mercado imobiliário brasileiro. Muitos compradores, por motivos diversos, decidem encerrar o contrato de compra e venda antes da entrega do bem. Assim, surge a dúvida: quanto da quantia paga eu recebo de volta no distrato de imóvel? Este artigo aborda o tema de forma técnica, clara e completa, esclarecendo os direitos do comprador, os limites de retenção da construtora e as diferenças entre distrato e resolução contratual por descumprimento. Com base na legislação vigente, incluindo o Código Civil e a Lei do Distrato, explico cada aspecto para orientar consumidores e investidores.

O que é o distrato de imóvel?

O distrato de imóvel ocorre quando as partes, comprador e construtora, decidem, de comum acordo, encerrar o contrato de compra e venda. Em geral, o comprador desiste da aquisição por motivos financeiros, pessoais ou estratégicos. Contudo, a desistência unilateral também é comum, especialmente quando o comprador não consegue mais arcar com as parcelas. Nesse caso, a legislação regula como deve ser a devolução dos valores pagos.

De acordo com o artigo 35-A da Lei nº 4.591/1964, alterada pela Lei nº 13.786/2018, conhecida como Lei do Distrato, o distrato ocorre quando o comprador manifesta sua intenção de não prosseguir com o contrato. A lei estabelece que “o incorporador deverá restituir os valores pagos pelo adquirente, atualizados com base no índice contratualmente estabelecido para a correção monetária das parcelas, deduzidas as penalidades previstas”. Assim, a legislação protege o comprador, garantindo a devolução de parte do que foi pago, mas permite que a construtora retenha valores para cobrir despesas.

Além disso, o distrato não se confunde com a resolução contratual por culpa da construtora. No distrato, a iniciativa parte do comprador ou é consensual. Por isso, a construtora tem direito a reter parte dos valores pagos. Para entender quanto do montante pago retorna ao comprador, é essencial analisar as regras de retenção.

Qual o valor de retenção que a construtora tem direito?

A Lei do Distrato estabelece limites claros para a retenção de valores pela construtora. Conforme o artigo 35-A, inciso I, da Lei nº 4.591/1964, “o incorporador poderá reter até 25% (vinte e cinco por cento) dos valores pagos pelo adquirente, a título de penalidade compensatória, desde que tal percentual esteja expressamente previsto no contrato”. Portanto, a construtora pode reter até um quarto do que o comprador pagou, desde que essa cláusula esteja no contrato.

Além disso, a lei permite a retenção de outros valores, como a comissão de corretagem, desde que também prevista contratualmente. O artigo 35-A, inciso II, determina que “as despesas com a fruição do imóvel, como taxas de ocupação ou frutos percebidos, poderão ser deduzidas”. Isso significa que, se o comprador já utilizou o imóvel, a construtora pode descontar valores proporcionais ao período de uso.

No entanto, a retenção não é automática. O Código Civil, em seu artigo 413, estabelece que “a penalidade deve ser reduzida equitativamente pelo juiz, se for manifestamente excessiva, tendo em vista a natureza e a finalidade do negócio”. Assim, se a retenção de 25% for considerada abusiva, o juiz pode reduzi-la. Por exemplo, se o comprador pagou poucas parcelas, a retenção integral de 25% pode ser desproporcional, levando o juiz a determinar um percentual menor.

Vale destacar que a construtora deve devolver o saldo remanescente em até 180 dias após o distrato, conforme o artigo 35-A, inciso III. Esse prazo permite que a construtora reorganize suas finanças, mas garante ao comprador o direito à restituição. Além disso, os valores devolvidos devem ser corrigidos monetariamente, conforme o índice previsto no contrato, geralmente o INCC ou o IPCA.

A retenção de 25% é o máximo, não o mínimo no distrato de imóvel

Embora a Lei do Distrato permita a retenção de até 25%, esse percentual é o teto, não o piso. Em outras palavras, a construtora não é obrigada a reter o valor máximo. Antes da Lei nº 13.786/2018, os tribunais brasileiros, com base no Código Civil e no Código de Defesa do Consumidor, frequentemente determinavam a retenção de apenas 10% dos valores pagos. Assim, o comprador recebia de volta 90% do montante.

Essa prática judicial permanece comum, mesmo após a Lei do Distrato. Os juízes consideram que a retenção de 10% é suficiente para cobrir as despesas da construtora, como custos administrativos e de marketing. Além disso, a construtora recupera o imóvel, que pode ser vendido novamente, muitas vezes por valor superior ao original. Portanto, a retenção de 25% raramente é aplicada na íntegra, especialmente quando o comprador busca a via judicial.

Por exemplo, em um contrato de R$ 500.000,00, com R$ 100.000,00 pagos, a construtora poderia reter até R$ 25.000,00 (25%). Contudo, os tribunais frequentemente reduzem esse valor para R$ 10.000,00 (10%), devolvendo R$ 90.000,00 ao comprador. Essa redução beneficia o consumidor, mas ainda é vantajosa para a construtora, que mantém o imóvel para nova comercialização.

Além disso, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já decidiu, em diversos julgados, que cláusulas contratuais que impõem penalidades excessivas ao consumidor são abusivas. Assim, a retenção deve ser proporcional ao prejuízo efetivo da construtora. Por isso, o comprador que busca orientação jurídica pode garantir a devolução de valores mais altos do que o previsto inicialmente no contrato.

Diferença entre distrato de imóvel e resolução por descumprimento da construtora

É fundamental distinguir o distrato da resolução contratual por descumprimento da construtora. No distrato, a iniciativa de encerrar o contrato parte do comprador ou é consensual. Já na resolução por descumprimento, o contrato é encerrado porque a construtora não cumpriu suas obrigações. Exemplos comuns incluem atraso na entrega da obra ou entrega do imóvel com defeitos graves.

O Código Civil, em seu artigo 475, estabelece que “a parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e danos”. Assim, se a construtora atrasa a entrega ou entrega um imóvel com vícios de construção, o comprador pode pleitear a resolução do contrato.

Na resolução por descumprimento, o comprador não está sujeito à retenção de 25%. Pelo contrário, ele tem direito à devolução integral dos valores pagos, conforme o artigo 35-A, parágrafo único, da Lei nº 4.591/1964: “em caso de resolução do contrato por culpa exclusiva do incorporador, os valores pagos pelo adquirente serão integralmente restituídos, acrescidos de eventuais penalidades contratuais”. Além disso, o comprador pode exigir multas contratuais previstas no contrato, como penalidades por atraso.

Por exemplo, se o contrato prevê multa de 2% ao mês por atraso na entrega, o comprador pode cobrar esse valor. Além disso, o comprador pode pleitear indenização por perdas e danos, como custos com aluguel ou lucros cessantes. Essa indenização é prevista no artigo 402 do Código Civil, que determina: “salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar”.

Direitos do comprador na resolução por descumprimento

Quando a construtora descumpre o contrato, o comprador tem direitos mais amplos do que no distrato. Primeiro, ele recebe de volta todos os valores pagos, sem qualquer retenção. Esses valores devem ser corrigidos monetariamente desde a data de cada pagamento, conforme o índice contratual. Além disso, a devolução deve ser imediata, sem o prazo de 180 dias previsto para o distrato.

Segundo, o comprador pode cobrar multas contratuais. Muitos contratos preveem penalidades para a construtora em caso de atraso ou entrega de imóvel com defeitos. Por exemplo, um contrato pode estipular multa de 0,5% ao mês sobre o valor do imóvel por atraso na entrega. Assim, se a construtora atrasar seis meses, o comprador pode exigir 3% do valor do imóvel como multa.

Terceiro, o comprador pode pleitear indenização por perdas e danos. Essa indenização abrange prejuízos diretos, como despesas com aluguel enquanto o imóvel não foi entregue, e indiretos, como a perda de oportunidades de negócio. O artigo 403 do Código Civil reforça que “ainda que a inexecução resulte de dolo do devedor, as perdas e danos só incluem os prejuízos efetivamente sofridos”.

Por fim, o comprador pode acionar a Justiça para garantir seus direitos. O Código de Processo Civil, em seu artigo 784, inciso I, considera o contrato de compra e venda um título executivo extrajudicial. Assim, o comprador pode ingressar com uma ação de execução para cobrar os valores devidos, agilizando a recuperação do montante.

Conclusão

O distrato de imóvel é uma ferramenta jurídica que permite ao comprador encerrar o contrato de compra e venda, mas envolve a retenção de até 25% dos valores pagos pela construtora. Contudo, os tribunais frequentemente reduzem esse percentual para 10%, garantindo ao comprador a devolução de 90% do montante. Por outro lado, na resolução por descumprimento da construtora, o comprador tem direito à restituição integral, além de multas e indenizações. Assim, é essencial que o comprador conheça seus direitos e busque orientação jurídica para maximizar a recuperação dos valores pagos. Com base no Código Civil e na Lei do Distrato, o consumidor pode tomar decisões informadas e proteger seu patrimônio.

Caso queira mais informações sobre esse tipo de processo, acesse o site oficial de Thales de Menezes.

Thales de Menezes

Advogado em Goiânia (GO) especialista em Direito Imobiliário e Direito de Inventário.

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