Responsabilidade dos condôminos pelas dívidas

Antes de iniciar o artigo é preciso esclarecer que o “condomínio” aqui tratado não se refere necessariamente a um prédio, mas sim todo bem que possui vários proprietários. Nesse contexto é que abordarei a Responsabilidade dos condôminos pelas dívidas do bem.

A copropriedade de um bem, seja ele imóvel urbano ou rural, pode ocorrer de forma indivisa. Nesse tipo de condomínio, chamado de condomínio comum ou geral, os coproprietários compartilham a posse, o uso e os encargos do bem.

Quando o bem pertence a mais de uma pessoa, naturalmente surgem despesas e obrigações relacionadas à sua conservação, administração ou eventual fruição econômica. Surge, então, a dúvida: como se distribuem essas obrigações entre os condôminos?

O artigo 1.317 do Código Civil trata exatamente dessa questão. O dispositivo determina a responsabilidade de cada condômino quando a dívida é contraída em nome de todos, sem especificar a parte de cada um e sem cláusula de solidariedade.

Neste artigo, analiso detalhadamente o artigo 1.317 do Código Civil. Aponto sua aplicação prática, sua relação com os demais dispositivos do capítulo do condomínio comum e os cuidados jurídicos que os condôminos devem adotar ao contrair dívidas conjuntas.

O que diz o artigo 1.317 do Código Civil

A redação literal do artigo 1.317 do Código Civil é a seguinte:

“Quando a dívida houver sido contraída por todos os condôminos, sem se discriminar a parte de cada um na obrigação, nem se estipular solidariedade, entende-se que cada qual se obrigou proporcionalmente ao seu quinhão na coisa comum.”

Esse artigo trata da repartição de uma dívida comum. Ocorre quando todos os condôminos assumem uma obrigação, mas o contrato não especifica quanto cada um deve pagar nem estabelece solidariedade.

A regra é clara: na ausência de estipulação específica, a dívida será dividida proporcionalmente à parte ideal de cada condômino.

A obrigação proporcional como regra legal

O artigo 1.317 impõe a regra da responsabilidade proporcional. Isso significa que, mesmo que a dívida tenha sido contraída conjuntamente, cada condômino responde apenas por sua fração ideal.

Se um condômino possui 40% da coisa comum, ele será responsável por 40% da dívida. Os demais responderão na medida de seus quinhões. Esse critério assegura justiça e equilíbrio entre os coproprietários.

Essa regra se aplica quando não há cláusula de solidariedade. A solidariedade não se presume. Ela deve estar expressa no instrumento que originou a obrigação, conforme estabelece o artigo 265 do Código Civil:

“A solidariedade não se presume; resulta da lei ou da vontade das partes.”

Portanto, na ausência de disposição contratual ou legal em sentido contrário, aplica-se a responsabilidade proporcional prevista no artigo 1.317.

Diferença entre obrigação proporcional e solidariedade

É importante distinguir a obrigação proporcional da obrigação solidária. Na obrigação proporcional, cada devedor responde por sua parte. O credor deve cobrar individualmente cada condômino.

Já na solidariedade, o credor pode cobrar a totalidade da dívida de qualquer um dos devedores. O artigo 275 do Código Civil assim dispõe:

“O credor pode exigir de um ou de alguns dos devedores, parcial ou totalmente, a dívida comum.”

Portanto, se o contrato entre os condôminos e o terceiro credor não prever solidariedade, cada condômino responde apenas pela parte que lhe cabe, com base em seu quinhão.

A solidariedade pode trazer riscos ao condômino que detém menor parte no bem, pois ele poderá ser cobrado pela totalidade do débito. Por isso, sua estipulação deve ser feita com cautela e de forma expressa.

Como identificar a parte ideal de cada condômino

A divisão da dívida depende do conhecimento da fração ideal de cada condômino. Em regra, presume-se que os quinhões são iguais, salvo prova em contrário.

O artigo 1.315 do Código Civil estabelece essa presunção:

“O condômino é obrigado, na proporção de sua parte, a concorrer para as despesas de conservação ou divisão da coisa, e a suportar os ônus a que estiver sujeita.”

Parágrafo único: “Presumem-se iguais as partes ideais dos condôminos.”

Se não houver escritura ou outro título que estabeleça as frações ideais, aplica-se essa presunção de igualdade. Nesse caso, a dívida será dividida igualmente entre todos.

Entretanto, se o título de propriedade indicar partes distintas, a divisão da dívida obedecerá esses percentuais. Essa interpretação está em conformidade com o princípio da justiça distributiva, que norteia o direito das obrigações.

Aplicações práticas do artigo 1.317

O artigo 1.317 se aplica em diversas situações da vida prática.

Primeiro exemplo: três herdeiros recebem um imóvel em condomínio. Decidem contratar um advogado para regularizar o bem, sem firmar contrato escrito. O advogado cobra R$ 9.000,00. Como não houve estipulação de solidariedade e não se especificou a parte de cada um, presume-se que cada herdeiro deve R$ 3.000,00.

Segundo exemplo: dois proprietários de um imóvel rural resolvem pagar um laudo ambiental para futura venda da propriedade. Contratam o serviço conjuntamente, mas um deles detém 70% do bem. Nesse caso, ele será responsável por 70% do valor da dívida, e o outro por 30%.

Terceiro exemplo: quatro coproprietários contratam um serviço de manutenção no imóvel comum, mas não assinam nenhum documento. O valor é de R$ 4.000,00. Como não há estipulação contratual nem diferença entre os quinhões, presume-se que cada um responde por R$ 1.000,00.

Esses exemplos mostram que a regra do artigo 1.317 assegura a distribuição justa das obrigações, conforme a titularidade de cada condômino.

E se um condômino pagar mais do que sua parte?

Se um dos condôminos pagar mais do que sua cota, ele pode exigir dos demais o ressarcimento proporcional. Essa previsão decorre do artigo 283 do Código Civil:

“O devedor que pagar a dívida por inteiro tem direito a exigir dos coobrigados a sua quota, proporcionalmente ao que lhes couber na obrigação comum.”

Esse dispositivo protege o condômino que assume uma obrigação além da sua responsabilidade legal. Além disso, impede o enriquecimento sem causa dos demais coproprietários.

Caso o ressarcimento não ocorra de forma amigável, o condômino prejudicado poderá ajuizar ação regressiva contra os demais, comprovando o pagamento e a titularidade das partes.

Relação com outros dispositivos do Código Civil

O artigo 1.317 deve ser interpretado sistematicamente com os demais artigos do capítulo “Do Condomínio”, entre os artigos 1.314 e 1.326 do Código Civil.

O artigo 1.314 trata do uso da coisa comum, dispondo que “cada condômino pode usar da coisa conforme sua destinação, desde que não exclua a utilização dos demais.”

O artigo 1.315 trata das despesas e ônus da coisa comum, estabelecendo a obrigatoriedade de cada condômino contribuir com base em sua parte ideal.

Já o artigo 1.316 autoriza o condômino a renunciar sua parte ideal para se eximir das obrigações, desde que observados os requisitos legais.

O artigo 1.318, por sua vez, prevê que o condômino pode reivindicar a sua parte separadamente, se a coisa for divisível.

A análise conjunta desses artigos permite compreender o regime jurídico do condomínio comum e a forma como os ônus e responsabilidades devem ser repartidos entre os coproprietários.

A importância da formalização dos contratos

O artigo 1.317 revela a importância de se firmar contratos claros e bem redigidos quando condôminos contraem obrigações em nome do grupo.

É recomendável que o contrato especifique a parte de cada condômino na obrigação. Caso se deseje que todos respondam por igual, mesmo com partes desiguais no bem, é necessário estipular cláusula de solidariedade.

Além disso, deve-se guardar cópia assinada do contrato, preferencialmente com reconhecimento de firma, para evitar dúvidas futuras.

Quando não houver contrato ou este for omisso, aplica-se a regra legal: responsabilidade proporcional ao quinhão de cada um.

A responsabilidade perante terceiros

O credor que contrata com os condôminos deve observar o que foi pactuado. Se o contrato não estipular solidariedade nem a parte de cada condômino, ele terá que cobrar individualmente, respeitando os percentuais legais.

O credor não poderá exigir o total da dívida de um só condômino, salvo se este tiver assumido a obrigação de forma solidária ou integral.

Essa limitação protege o patrimônio individual de cada condômino e impede que um deles suporte sozinho uma dívida comum.

Contudo, o credor pode buscar garantias complementares, como fiança, hipoteca ou alienação fiduciária, para resguardar o cumprimento da obrigação.

Considerações finais

O artigo 1.317 do Código Civil estabelece regra clara e justa para a repartição das dívidas contraídas em nome de todos os condôminos. Na ausência de cláusula de solidariedade e de discriminação da parte de cada um, presume-se que a obrigação é proporcional à fração ideal.

Essa regra preserva o equilíbrio patrimonial e impede que um condômino arque com encargos que não lhe competem. Além disso, assegura transparência nas relações jurídicas entre condôminos e entre estes e terceiros.

Recomenda-se sempre formalizar os contratos e especificar a responsabilidade de cada condômino, evitando dúvidas e litígios. Na dúvida, consulte um advogado especializado em direito imobiliário.

A correta compreensão do artigo 1.317 é essencial para quem participa de um condomínio comum, seja por herança, compra conjunta ou qualquer outro título. Afinal, a boa convivência e a gestão eficiente do patrimônio exigem clareza quanto aos direitos e deveres de cada coproprietário.

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Thales de Menezes

Advogado em Goiânia (GO) especialista em Direito Imobiliário e Direito de Inventário.

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